Conselho aprova modelo de Fundação para gestão do Hospital Ouro Verde

Marco Aurélio Capitão

Por unanimidade, com 24 votos favoráveis, o Conselho Municipal de Saúde (CMS), reunido em sessão extraordinária na noite desta quarta-feira, 1º de setembro, aprovou a criação de uma Fundação Pública de Direito Privado para gerir o Complexo Hospitalar Ouro Verde (CHOV). Esse formato jurídico de administração foi sugerido pela Comissão Técnica para Estudos para a Viabilização da Municipalização da Gestão do Complexo Hospitalar Ouro Verde, criada para propor um novo modelo de gestão para a instituição.

A Comissão foi criada em virtude de uma deliberação do CMS que, no dia 12 de maio de 2010, por 21 votos favoráveis e oito contrários, propôs que o CHOV passasse a contar com uma gestão pública.

O Complexo Ouro Verde, inaugurado em junho de 2008, é administrado hoje por um sistema de cogestão entre a Prefeitura de Campinas, Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM). Esse convênio foi encerrado em junho e deve ser renovado até que a nova gestão proposta pelo CMS esteja em condições de assumir.

O relatório com as diretrizes e parâmetros para a criação da Fundação foi lido na sessão desta quarta-feira pelo professor Nelson Rodrigues dos Santos, o Nelsão, do Departamento de Medicina Preventiva e Social (DMPS) da Unicamp e membro da Comissão Técnica. Antes, a conselheira Izabel Pereira de Oliveira descreveu, passo a passo, os trabalhos desenvolvidos pela Comissão Técnica desde 30 de junho deste ano.

“Foi uma sessão histórica do Conselho Municipal de Saúde, que mostrou maturidade e uma grande capacidade de mobilização. Mais importante que isso, esse processo de discussão que culminou com a escolha da Fundação Pública indica a retomada da participação popular nas decisões de interesse público”, disse o presidente do Conselho Municipal de Saúde, Pedro Humberto Scavariello.

No seu modo de ver, os estudos desenvolvidos desde que o Conselho deliberou pela municipalização demonstram que, mesmo com uma composição heterogênea, a Comissão Técnica cumpriu sua missão e atendeu a demanda dos conselheiros. “A gestão plena do SUS é uma antiga reivindicação dos movimentos populares, que foi reforçada na Caravana em Defesa do Sistema Único de Saúde que organizamos em setembro do ano passado. Hoje, nesta sessão histórica do Conselho, o mérito dessa aprovação deve ser creditado ao controle social”, finalizou Pedro Humberto.

O secretário municipal de Saúde, José Francisco Kerr Saraiva, que integrou a mesa diretora da sessão extraordinária desta quarta-feira, aplaudiu a decisão do Conselho e declarou que a Fundação Pública de Direito Privado atende todas as exigências para integrar as políticas de saúde do Município. “Este Governo não abre mão da gestão nos serviços públicos de saúde e vamos mostrar nosso apoio aos trabalhos e aos estudos que buscam as alternativas que caminham nesse sentido”, afirmou o secretário.

José Francisco Saraiva lembrou que a discussão da implantação de uma Fundação Pública de Direito Privado já foi trazida para dentro do Governo em novembro de 2009, quando o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, defendeu esse modelo de gestão na 13ª Conferência Nacional de Saúde. “Essa idéia, por uma série de motivos, não prosperou na época e agora a proposta, fortalecida, retorna com nosso apoio e tem tudo para dar certo em Campinas”, afirmou

Começo de uma nova era.

“Agora é que a luta vai começar. Hoje aqui no Salão Vermelho conseguimos uma vitória política. Agora precisamos de saídas jurídicas para embasar as idéias que conseguimos no campo político”, ponderou o professor Nelson Rodrigues dos Santos. Para ele, a sociedade precisa continuar mobilizada para buscar saídas para combater o subfinanciamento do SUS e as amarras colocadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Nelsão, que desde o início defendeu o modelo de gestão das fundações públicas de direito privado para o Ouro Verde, frisou que a mudança de gestão do hospital ainda não ocorreu. “Estamos apenas no início de um trabalho árduo. Agora temos que nos reunir à exaustão para encontrar excepcionalidades legais que possam aproximar os direitos celetistas dos estatutários. Temos que fazer isso com muito cuidado, pois sabemos que a precarização das relações de trabalho ocorre nos dois regimes”, advertiu o professor.

Próximos passos.

Agora, de acordo com as metas previstas pela Comissão Técnica, cabe ao Conselho Municipal de Saúde de Campinas, entre outras providências, solicitar audiências com o prefeito e vereadores para negociar a questão, da qual participariam, também, representantes da Comissão. Será solicitado ao prefeito a elaboração, pela Secretaria de Assuntos Jurídicos, de uma lei para o novo ente público mediante os princípios e diretrizes elencados. A elaboração dessa lei teria o acompanhamento e a parceria do Conselho Municipal de Saúde.

Deverá ser proposto ao governo, ainda, que o Governo constitua, com acompanhamento e parceria do Conselho, o Estatuto da Fundação, mediante os princípios e diretrizes colocados. Caberá ao CMS, segundo a Comissão Técnica, a contratação de uma assessoria jurídica para fazer o acompanhamento desses trâmites. O mesmo CMS estabelecerá prazos para cada uma das etapas de constituição dessa Fundação, o que inclui a formulação da lei municipal, formulação do estatuto, nomeação de corpo de gestores para fazer a transição e início efetivo do funcionamento da Fundação.

Fundação tem autonomia e receita e foge da limitação da Lei de Responsabilidade Fiscal

Dentro das diretrizes e parâmetros estabelecidos para a criação de Fundação Pública de Direito Privado, a Comissão Técnica estabeleceu algumas salvaguardas que foram lidas, na sessão de ontem, pelo professor Nelson Rodrigues dos Santos. Essas medidas também servirão de base para a elaboração do Projeto de Lei Municipal, que deverá ser discutido com a Câmara Municipal de Vereadores de Campinas. Leia abaixo a íntegra das nove salvaguardas que norteiam esse modelo de gestão:

1.      Mediante proposta de iniciativa do poder executivo, o legislativo pode discutir e aprovar Lei que cria ente público com autonomia gerencial em função do disposto no Art. 37, inciso XIX, § 8º, da Constituição Federal.

2.      O ente público com autonomia gerencial, no caso da saúde, deve prestar serviços em cumprimento de metas e de desempenho de acordo com as necessidades e direitos da população, e ser financiado pelo gestor público (Governo). O ente autônomo não presta serviços para o Governo sob contrato de metas; é o Governo prestando serviços à população. As metas e o desempenho, referendados no Conselho de Saúde, devem explicitar as prioridades, os indicadores de qualidade e a resolutividade.

3.      A autonomia gerencial ao constar em Lei, não é um cheque em branco para fugir do controle estatal (interno, externo ou social) nem de exigências legais, com exceção da limitação de pessoal determinada pela LRF pelo fato de ser ente autônomo não dependente da peça orçamentária. A autonomia deve ser delimitada e direcionada para cumprir com maior eficiência, eficácia e oportunidade, os princípios e diretrizes constitucionais da Universalidade, Integralidade, Equidade, Descentralização, Regionalização e Participação, com gratuidade, atendimento exclusivo SUS, fixação e adesão da equipe de saúde junto à população, porta de entrada única, sem esperas iatrogênicas e com acolhimento aos usuários.

4.      O financiamento da prestação de serviços integrais à saúde pelo ente autônomo é exclusivamente público, ficando vedado o exercício da autonomia para a venda de serviços a título de captação de recursos extra-orçamentários. Os repasses financeiros pelo gestor ao ente autônomo devem ser globais, regulares e não inferiores aos custos correspondentes aos cumprimentos das metas.

5.       É o gestor (governo), referendado pelo Conselho de Saúde, que define as unidades públicas que poderão ou não ser reestruturadas com autonomia gerencial, e contrato de autonomia para cumprimento de metas e desempenho condizentes com o planejamento da gestão pública conforme disposto no Art. 36 da Lei 8080/90. Aí prescreve o planejamento ascendente e sua inserção no planejamento regional e sua inserção nas respectivas linhas de cuidado de atenção integral à saúde, pactuadas aos níveis distrital, municipal e regional pelos Colegiados de Gestão Regional.

6.      As compras públicas, concursos e outros processos seletivos, o plano de cargos, empregos, carreiras e salários e as reposições, devem obedecer ao disposto na legislação da administração pública, com adequações de agilidade para o cumprimento do item 3. O quadro do pessoal é da CLT, admitindo-se o aproveitamento temporário de servidores estatutários optantes desde que haja vagas no quadro, e cumpridos mecanismos equiparadores. Um outro nível de equiparação dá-se na compatibilização do plano de carreiras, salários iniciais e benefícios trabalhistas da fundação com os dos servidores municipais do restante da rede de saúde de Campinas.

7.      A Direção Geral ou Presidência da Fundação Pública deve ser indicada pelo Secretário de Saúde, com preferência a técnico ou dirigente de carreira portador de reconhecida experiência na gestão pública de saúde. As demais funções de direção, coordenação e assessoria devem ser preenchidas por quadros de carreira ou provisoriamente por técnicos de reconhecida experiência na função, em ambos os casos, com critérios publicizados.

8.      Comissão de alto nível técnico e representativo, sob coordenação do gabinete da Secretaria da Saúde, devera propor projeto gerencial inicial da Fundação Pública com base nos seus objetivos institucionais e levando em conta os avanços bem sucedidos da atual gestão do CHOV, do HMMG e outros como o Hospital Regional de Sumaré (HES). Este projeto inicial deve ser debatido no colegiado de gestores da Secretaria de Saúde e no Conselho Municipal de Saúde.

9.      Composição de Conselho Local de Saúde, para a Fundação Pública, tripartite e paritário, de acordo com a lei municipal 6.547/91.

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